quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Navio Negreiro- Poesia de Castro Alves



Era um sonho dantesco!... O tombadilho,
Que das luzernas avermelha o brilho,
Em sangue a se banhar.
Tinir de ferros... estalar de açoite...
Legiões de homens negros como a noite,
Horrendos a dançar...
Negras mulheres, suspendendo às tetas
Magras crianças, cujas bocas pretas
Rega o sangue das mães:
Outras, moças, mas nuas e espantadas,
No turbilhão de espectros arrastadas,
Em ânsia e mágoa vãs!

E ri-se orquestra, irônica, estridente...
E da ronda fantástica a serpente
Faz doudas espirais...
Se o velho arqueja, se no chão resvala,
Ouvem-se gritos... o chicote estala.
E voam mais e mais...
Presa nos elos de uma só cadeia,
A multidão faminta cambaleia,
E chora e dança ali!
Um de raiva delira, outro enlouquece,
Outro, que de martírios embrutece,
Cantando, geme e ri!

No entanto o capitão manda a manobra.
E após fitando o céu que se desdobra
Tão puro sobre o mar,
Diz do fumo entre os densos nevoeiros:
"Vibrai rijo o chicote, marinheiros!
Fazei-os mais dançar!..."

E ri-se a orquestra irônica, estridente...
E da ronda fantástica a serpente
Faz doudas espirais...
Qual num sonho dantesco as sombras voam!...
Gritos, ais, maldições, preces ressoam!
E ri-se Satanás!...


Castro Alves foi um grande poeta que consagrou-se por expressar em seus versos a sua indignação diante de tanta atrocidade que se cometia em nome de um "progresso" às custas da exploração de etnias indefesas,as quais eram ultrajadas de forma absurda. O que vemos nas imagens abaixo é apenas uma sombra do que foi, dia após dia, a realidade daqueles homens, mulheres e crianças; nossos semelhantes (embora alguns ainda hoje os considerem como não sendo por causa da sua própria falta de Deus que os faz pensar que são melhores que os demais por causa de sua cor ou posição social).

 



Nenhum comentário:

Postar um comentário